Se há algo que sempre aprendo acompanhando o crescimento das startups é que velocidade, tão somente por “velocidade”, não leva a empresa a lugar algum. Pode até impressionar no pitch, animar nas manchetes, mas não garante permanência. Muito menos retorno.

E por ser tão difícil, startups que conseguem escalar com eficiência se tornam, quase inevitavelmente, casos retumbantes de sucesso do ponto de vista de investimento.

A ideia de crescimento exponencial está no DNA das startups, sendo um fundamento que as define. No entanto, isso significa muito mais do que simplesmente “correr”. Significa:

  1. construir uma estrutura que suporte esse crescimento;
  2. validar o modelo com rigor;
  3. planejar os passos da expansão com muita visão de negócio.

Recentemente, durante a minha participação num painel no Smart Summit, brinquei logo de início sobre como um título como “O caminho para o sim: o que faz investidores apostarem num empreendedor” poderia assustar os participantes. Afinal, a verdade é que não tem receita de bolo para conquistar investidores. O que existe é muita força de vontade e um trabalho de “formiguinha” que começa nos detalhes menos óbvios, aqueles que raramente aparecem no pitch ou em posts românticos no LinkedIn.

É por isso que, hoje, trouxe uma das questões mais centrais do universo das startups: a escalabilidade. Não como uma palavra da moda, repetida à exaustão em slides de captação. Mas como um sistema que determina, com mais precisão do que o entusiasmo dos primeiros usuários, quais negócios estão prontos para crescer, e quais não estão.

Quando crescer cedo demais significa falhar mais rápido

Escalar se tornou uma espécie de dogma no mercado de inovação. Há uma pressão implícita, às vezes até explícita, para que as startups acelerem sua curva de crescimento o mais rápido possível. Mas o que pouco se fala é que a antecipação dessa escala, quando descolada da estrutura, pode ser, apesar de toda a contradição, fatal para o negócio.

Verdade seja dita: startups não quebram por falta de ideia, mas por crescerem antes da hora ou sem o modelo validado.

Numa das pesquisas da Abstartups, ficou claro que cerca de 74% das startups brasileiras encerram suas atividades em até cinco anos. Em 42% dos casos, o motivo está ligado à falta de estrutura e gestão. Um outro estudo do CB Insights, com 111 startups que falharam entre 2018 e 2021, nos mostrou que 35% delas sucumbiram por não resolverem um problema real do mercado, ou seja, não havia demanda suficiente para sustentar o crescimento pretendido.

Olhe o caso da Quibi, que levantou US$ 1,75 bilhão antes de colapsar em apenas seis meses. Com uma ideia aparentemente boa, (conteúdo premium em formato curto para dispositivos móveis) a startup falhou por expandir antes de validar se os consumidores queriam o que ofereciam, ainda mais num mercado já saturado de opções como YouTube e TikTok.

Um outro exemplo é o da WeWork, que chegou a ser avaliada em US$ 47 bilhões antes de implodir. A empresa apostou numa expansão sem ter clareza sobre rentabilidade e sem controle de custos. O resultado não poderia ser outro: um modelo insustentável que virou referência negativa em como não escalar.

Isso acontece porque empresas que crescem sem estrutura estouram no meio do caminho. Escalar exige planejamento, capital, time preparado e uma gestão que permita acompanhar KPIs em tempo real.

E, no dia a dia, os erros mais recorrentes são bem menos glamourosos que os valuations inflados dos ciclos de captação. Contratar antes da hora, ignorar sinais de desalinhamento com o cliente, expandir para mercados que não foram testados e perder o foco do business core são todos sintomas de um crescimento que acontece antes do momento certo. Ou, pior, que acontece por pressão externa, e não por mérito interno.

A escalabilidade é como uma virtude do modelo, não um produto do improviso. E as startups que escalam com eficiência são aquelas que conseguiram traduzir uma hipótese em sistema, uma solução em processo e uma visão em operação sustentável.

Os instrumentos da orquestra certa

Você vai concordar comigo que, assim como um negócio precisa de estrutura interna para escalar, ele também precisa de um ambiente externo minimamente favorável. E já é de conhecimento comum que as startups não prosperam no meio do nada. Elas precisam de ecossistemas (não à toa usamos essa palavra).

Mas o que define um ecossistema de startups de alto desempenho?

Para o Global Startup Ecosystem Report 2024, os cinco fatores que mais influenciam o sucesso de um ecossistema são:

  1. desempenho
  2. acesso a capital,
  3. talento e experiência,
  4. alcance de mercado e
  5. base de conhecimento.

É por isso que hubs como o Vale do Silício, Londres, Tel Aviv e Bangalore permanecem como referência, concentrando, há décadas, densidade de empreendedores, cultura de risco, ciclos de IPOs e uma certa “recorrência” quando o assunto é liquidez.

O Brasil, embora ainda opere em outra escala, tem avançado em algumas frentes importantes.

São Paulo, por exemplo, ocupa a 26ª posição no ranking global da Startup Genome (2023), a única cidade latino-americana entre os 30 primeiros colocados. Com mais de 2.700 startups ativas e um ecossistema avaliado em US$ 113 bilhões, ela lidera com folga no continente. E não apenas pelo volume de capital, mas pela sofisticação dos setores, como os das fintechs e agtechs.

O avanço, no entanto, não se limita à capital paulista. Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Florianópolis e outras cidades vêm ganhando espaço, alavancadas por marcos legais, hubs universitários e políticas públicas de fomento à inovação.

Inclusive, o Marco Legal das Startups representou um divisor de águas, ainda que a sua aplicação esteja longe de atingir o potencial que tem. Há avanços, sim, mas também

uma diversidade legislativa que confunde, uma burocracia que desanima e um desconhecimento que ainda trava a adoção de algumas dinâmicas intrínsecas ao operacional das startups.

Arrisco a dizer que o Brasil tem mais do que os instrumentos certos — o que falta, muitas vezes, é orquestração. Precisamos entender que o mercado só evolui quando existe educação, tecnologia e regulamentação específica. Sem essa sincronia, os avanços continuam aquém do seu potencial.

O futuro é startup-driven

Quando uma startup escala de forma eficiente, ela deixa de transformar apenas a sua própria trajetória para impactar um setor inteiro. E é fundamental entender: não estamos mais falando de startups como experimentos marginais ou alternativas de mercado. Elas já formam a nova economia.

Startups criam empregos, puxam a inovação em setores tradicionais, aceleram a digitalização de indústrias e conectam o país com tendências globais. Não são mais uma opção, mas sim um modelo para criar soluções no mundo complexo que estamos construindo.

Exemplos não faltam no Brasil. A Tractian não está apenas vendendo sensores, mas redefinindo como a indústria nacional faz manutenção preditiva. A Stark Bank não é só mais um banco digital, mas uma plataforma que está transformando como empresas de médio porte gerenciam seu fluxo financeiro. A Mottu não apenas aluga motos, mas revoluciona a mobilidade urbana e a logística da última milha nas cidades brasileiras.

Startups como Petlove, Blip, Omie, Celcoin e Flash vêm mostrando que é possível crescer com consistência e capacidade de moldar mercados. Para a Distrito, essas empresas estão no radar para alcançar o status de unicórnio já em 2025.

E o que vem por aí é ainda mais transformador. A integração da inteligência artificial nos processos corporativos, liderada por startups como Pipefy e Strateegia, está só começando. As biotechs nacionais, como a Genera e a Ribon Therapeutics, estão redefinindo a relação entre tecnologia e saúde. Startups de clima e energia limpa, como a Ambipar e a Mori, estão criando dinâmicas de sustentabilidade.

Mesmo num ambiente desafiador, as startups brasileiras continuam se destacando e conquistando seu espaço no mercado. Isso não é um acaso. É reflexo do amadurecimento do nosso ecossistema e da capacidade dos empreendedores do Brasil de transformar inovação em crescimento real.

Crescimento como tese e impacto como legado

A verdade é que a escalabilidade, por mais que tenha se tornado sinônimo de velocidade, é antes uma questão de precisão.

É saber quando acelerar e quando frear. É entender que o capital serve para ampliar o que já foi testado, não para esconder o que ainda não funciona. É perceber que o timing de uma startup não se mede pelo número de usuários ou pela manchete mais recente, mas pela sua capacidade de absorver complexidade sem perder foco — e de crescer, sim, mas sem perder a essência do que a tornou relevante.

Startups que transformam, de verdade, entendem que escalar não é apenas sobre multiplicar receita ou usuários, mas sim sobre criar um legado que gera impacto na economia.

A pergunta não deve ser apenas “quão rápido ela pode crescer?”, mas “ela está construindo algo que pode realmente transformar o mercado?”. Porque no final, as startups que prosperam não são necessariamente as mais rápidas, mas as que entenderam que crescimento sustentável é um projeto arquitetado, e não apenas uma consequência estatística.