Quando Harry Markowitz apresentou a Teoria Moderna do Portfólio em 1952, ele estabeleceu um princípio que transcenderia décadas: ‘a diversificação é o único “almoço grátis” das finanças’.

Mais de 70 anos depois, essa verdade ainda encontra sua aplicação no venture capital, em que a matemática do risco e retorno pede uma abordagem que os investidores estão, agora, começando a entender. O que quero dizer é que a diversificação é uma das estratégias mais fundamentais quando o assunto é gestão de patrimônio.

Se você investe ou deseja investir em startups, por exemplo, provavelmente já ouviu uma máxima que se repete como um mantra: “Diversifique”. Esse não é um conselho qualquer, posso afirmar.

Mas o que significa diversificar no venture capital? É investir em setores diferentes? É buscar startups em estágios variados? É uma questão de quantidade, qualidade ou ambos?

Existe uma lógica por trás desse conceito e será sobre ela que falaremos aqui.

A dinâmica assimétrica do Venture Capital

O primeiro ponto que qualquer investidor precisa entender é que venture capital não segue a mesma lógica dos mercados tradicionais.

Enquanto na Bolsa de Valores os retornos tendem a se distribuir de forma relativamente simétrica, com resultados concentrados em torno de uma média, no venture capital eles seguem uma dinâmica assimétrica, com eventos de liquidez que superam em muitas vezes a média do mercado. Além disso, startups apresentam menor correlação com ciclos macroeconômicos tradicionais, o que oferece uma camada adicional de proteção e diversificação ao portfólio do investidor.

Nessa modalidade, a ideia é garantir que uma parte do capital disponível seja alocado em diferentes estágios e setores, a fim de diminuir a exposição ao risco e trazer para o portfólio as startups com potencial de gerar retornos que compensarão aquelas que “andarão de lado” ou que não “irão para frente”.

A estratégia do “Diversificar 2x”

O que eu chamo aqui de “Diversificar 2x” parte de uma lógica simples dentro do venture capital.

A primeira diversificação acontece quando o investidor aloca parte do patrimônio em startups, uma classe de ativos descorrelacionada das demais, com alto potencial de retorno.

A segunda diversificação se dá dentro do próprio universo de startups: em vez de investir em 2 ou 3 empresas, o investidor deve ampliar a exposição e buscar modelos de negócio distintos, setores variados e estágios diferentes de maturidade.

Então, se você acha que 5 ou 6 startups são suficientes para obter o potencial desse mercado, dobre. E, se estiver confortável com 10, dobre de novo.

Ou seja, se você quer investir com estratégia, precisa entender que a diversificação é uma condição necessária para obter retorno com essa classe de ativo.

Lembrando, sempre, que investir em startups não é, e nem deve ser, o centro da sua estratégia de alocação patrimonial. Afinal, estamos falando de um ativo de risco e baixa liquidez, e por isso, o investidor deve entender quanto do seu patrimônio total faz sentido alocar nessa classe.

Mais que quantidade é a qualidade somada à estratégia

Uma vez que se tenha definido quanto do patrimônio será investido em startups, aí sim entra o raciocínio da “Diversificação 2x”.

Aqui, diversificar não significa apenas quantidade. Significa, também, buscar diferentes setores, modelos de negócios e estágios de maturidade. Cada uma dessas variáveis contribui para que o portfólio não fique dependente de uma única tese, de um único mercado ou de um ciclo específico da economia.

Então, poderíamos dizer que isso acontece em duas grandes dimensões:

  1. Por estágio, combinando startups em fase seed, early e growth;
  2. Por setor ou tese, diluindo riscos específicos de mercados, como saúde, logística, energia, entre outros;

Para conhecimento, uma análise conduzida pela IMD Business School, com dados da CEPRES Market Intelligence, mostrou que fundos que diversificam nesses três eixos tendem a apresentar retornos superiores aos de fundos concentrados.

Fundos setorialmente diversificados, por exemplo, apresentaram uma mediana de IRR de 13,5%, superando em 3,5 pontos percentuais os fundos focados exclusivamente em tecnologia. Na diversificação geográfica, fundos globais obtiveram uma mediana de 11,5%, frente a 10,2% dos que atuam apenas na América do Norte, um prêmio de 1,3 ponto percentual.

Startups de setores diferentes estão expostas a riscos muito distintos. Uma startup do agronegócio, por exemplo, responde a riscos climáticos e de cadeia logística. Já uma healthtech pode estar mais sujeita a marcos regulatórios e validações clínicas. Entender essas nuances é o que permite montar um portfólio verdadeiramente eficiente.

Qual é o erro mais comum do investidor iniciante

Ao começar a investir em startups, muitos investidores, até de perfis sofisticados no mercado tradicional, têm certa dificuldade de assimilar esse conceito. É comum acreditarem que, ao escolher 2 ou 3 startups, estão suficientemente expostos às oportunidades desse mercado, e não estão. Quando se tem poucas startups no portfólio, o erro passa a ser estratégico já que se limitam os horizontes de retorno.

Por que o Venture Capital pede tanta disciplina?

Porque, em venture capital, não se trata de acertar todas. Na verdade, espera-se que uma parte das startups da carteira não performe como esperado. Isso é inerente à própria natureza da operação.

A dinâmica desse mercado tem bastante da lógica que o Sebastian Mallaby descreve em seu livro “A lei da potência: capital de risco e a criação do novo futuro”.

Num portfólio de startups, muitas empresas não geram retornos e apenas algumas alcançam valuations exponenciais, como os que vimos na história da Apple, Amazon e tantas outras.

Mas essas são tão bem-sucedidas, que, além de compensarem as eventuais perdas das demais, também multiplicam o capital de maneira extraordinária. Basta olhar o caso da Y Combinator: três quartos de todo o lucro que ela gerou vieram de duas startups entre as 280 nas quais aportou capital, ilustrando a “lei da potência”, em que a maior parte dos retornos provém de um pequeno número de investimentos de sucesso.

E o investidor, naturalmente, só consegue acessar essa possibilidade se tiver disciplina, consistência e muita visão de longo prazo para construir uma carteira que respeite a matemática do mercado.

O que realmente protege e aperfeiçoa o portfólio

O investimento em startups pede a clareza de que a diversificação como estratégia é a melhor aliada do investidor. Não se trata de “empurrar” investimentos, mas de cultivar uma mentalidade de alocação patrimonial que otimiza ganhos e mitiga os riscos.

Seu portfólio de startups tem hoje o tamanho adequado para capturar as assimetrias do venture capital? Essa é a reflexão que todo investidor deve fazer.

A resposta, como vimos, está na capacidade de diversificar com estratégia e consistência, construindo um portfólio que busca retorno e, ao mesmo tempo, protege o capital e incentiva a visão de longo prazo.